05 / 12 / 21

O SUPREMO IMPOSTO

 

 

“Todo imposto é ruim, por isso chama-se imposto, senão se chamaria voluntário.”
(Fernando Henrique Cardoso)

O SUPREMO IMPOSTO

Com a fatura de energia elétrica nas mãos, podemos visualizar que é composta, em média, das seguintes parcelas: Geração (34,5%); Transmissão (6,5%); Distribuição (20,3%); Encargos (7,7%); PIS/COFINS (9,2%) e ICMS (21,8%). Isso sem falar nas bandeiras tarifárias, custo que varia em função do uso das térmicas, e de 11% da COSIP (Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública), instituída pela Emenda Constitucional nº 39, de 19/12/2.002, de características inovadoras porque na realidade é um tributo com o nome de contribuição.

A parcela de impostos e encargos sempre foi muito criticada nas contas de energia elétrica, em algumas distribuidoras chegando a representar 47% quando se usa a bandeira tarifária vermelha patamar 2. Dentre esses impostos está o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e que recentemente foi alvo de alegação do presidente Jair Bolsonaro sobre o seu peso do preço dos combustíveis. É certo que em muitos estados o ICMS joga os preços para cima, mas pouco deles elevou a alíquota nos últimos tempos. A questão é que, mesmo não mexendo no percentual do imposto, a arrecadação do mesmo cresce porque com o aumento dos custos dos produtos o mesmo percentual vai fazer um recolhimento maior. Além do mais, cresce em duas situações porque aumenta sobre o custo do produto e, como passa a fazer parte do mesmo, aumenta também quando a alíquota é aplicada sobre ele mesmo, ou seja, é o conhecido “cálculo por dentro”.

Tendo uma amplitude de 99% sobre os lares brasileiros, pois quase todos foram beneficiários da universalização da energia elétrica, as distribuidoras são de grande eficiência arrecadatória para os estados porque se o consumidor não pagar, o fornecimento é cortado. Por outro lado, mesmo que o consumidor não pague a conta de luz, os estados exigem que as distribuidoras recolham o imposto, mesmo não tendo sido arrecadado, porque consideram que a conta de luz é uma Nota Fiscal e, sendo emitida, o imposto já é devido.

Objetivando a redução dos custos com a energia elétrica, a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) decidiu recentemente antecipar a devolução de parte dos créditos de PIS/COFINS, limitados a 20% da soma de valores envolvidos nas disputas judiciais. Pouco tempo atrás, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que o ICMS não pode incidir sobre o PIS/COFINS, situação em que se pagava um imposto sobre outro imposto. Segundo a Agência, esse é um montante da ordem de R$ 50 bilhões e deverá ser repassado em cinco anos para aliviar um pouco o bolso do consumidor de energia elétrica.

Outra importante decisão do STF também ocorreu em relação à cobrança do ICMS na energia. O imposto era aplicado sobre a demanda contratada de energia elétrica e a decisão é que deve ser aplicado sobre a demanda registrada. Comparativamente, imaginem que se cobrava um imposto pela estrada e não pela mercadoria e o serviço que por ela se movimentava.

Agora, o STF (Supremo Tribunal Federal) considerou inconstitucional a adoção do princípio de seletividade para a cobrança de alíquotas do ICMS para as tarifas de energia elétrica e de serviços de telecomunicações. Apesar de não alterar as legislações estaduais, a decisão pode ser replicada em outros processos semelhantes, utilizando-se o princípio da jurisprudência. Desde 1996 estava no STF uma ação movida pelas Lojas Americanas contra o governo de Santa Catarina, que estabeleceu uma alíquota de 25% para os serviços de eletricidade e de telecomunicações, quando a média em outros produtos é de 17%. O relator desse processo era o ministro Marco Aurélio, agora aposentado, que em 2014 já havia decidido em seu voto e do ministro Gilmar Mendes que, em outubro do ano passado, devolveu o processo para inclusão na pauta de julgamento.

A votação em Plenário se deu no dia 22/11/2021 e, por 8 votos a 3, com o entendimento que a tributação vai variar para cima e para baixo em função da essencialidade da mercadoria, dando margem para que bebidas alcoólicas e cigarros, por exemplo, podem ser afetados por alíquotas mais elevadas, mas para os serviços de eletricidade e telecomunicações devem variar entre 17% e 20%. Em São Paulo aplica-se uma alíquota de 12% para o consumo residencial de até 200 kWh/mês e de 25% para consumos superiores a 200 kWh/mês. Para os segmentos comercial, industrial, serviços e poder público, a alíquota é de 18%. No Rio de Janeiro é cobrado 20% para os consumidores de baixa renda e consumo até 300 kWh/mês; de 300 kWh/mês até 450 kWh/mês a alíquota é de 31% e acima desse consumo cobra-se 32% de imposto. No Tocantins a alíquota aplicada é de 17%. Em Alagoas, o residencial com consumo mensal até 30 kWh está isento; na faixa de 31 kWh à 150 kWh tem uma alíquota de 17%; acima de 150 kWh de consumo mensal paga 27% de ICMS; o comercial até 150 kWh tem uma alíquota de 17%; acima de 150 kWh/mês de consumo, é 27%; e as demais classes tem uma alíquota de 17%. Mas, como é feito o “cálculo por dentro”, quando o imposto é calculado com ele já fazendo parte do produto, o 17% vira 20,48% e o 27% vira 36,98%. Calcula-se que a perda para os estados está na ordem de R$ 26,7 bilhões em arrecadação, que na realidade não é perda total porque o consumidor vai utilizar essa economia na energia para pagar imposto em outro tipo de produto que vai adquirir.

Esse tema surge num horizonte de muito debate sobre o alto custo das tarifas de energia elétrica e dos preços dos combustíveis. No caso da eletricidade, a crise hídrica fez com que fossem colocadas em operação um elevado despacho de geração térmica. Foi criada e aplicada uma bandeira de escassez hídrica, com valores maiores do que as anteriormente aprovadas, com reflexo no custo final da energia elétrica, o que certamente também aumentou a arrecadação do ICMS pelos estados. Para 2022 a ANEEL já sinalizou que os aumentos médios das tarifas estão na ordem de 21% e, no caso dos combustíveis, a influência dos preços internacionais do petróleo e alta cotação do dólar certamente farão a Petrobras, principal produtora de gasolina e de óleo diesel, elevar os preços nas refinarias.

Como na maioria dos estados os pequenos consumidores são, praticamente, isentos de ICMS, a decisão do STF vai beneficiar as empresas e as residências de consumo mais alto. A decisão superior ainda não tem data para vigorar porque depende ainda de outros fatores como os julgamentos de ações com o mesmo objetivo, ações individuais ou mesmo de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Vão chover processos e muitas empresas já entraram com ações que buscam reaver os pagamentos dessas cobranças inconstitucionais nos últimos cinco anos. Espera-se também que as empresas que costumam repassar a alta de impostos para os preços dos seus produtos, venham também a reduzi-los por conta do imposto menor.

O SUPREMO IMPOSTO
por Geoberto Espírito Santo

GES Consultoria, Engenharia e Serviços

Geoberto Espírito Santo

SinergiaGeoberto Espírito Santo é Engenheiro Civil, formado em 1971 pela Universidade Federal de Alagoas. Atualmente é Consultor do SINDENERGIA – Sindicato das Indústrias de Energia do Estado de Alagoas e Personal Energy da GES Consultoria, Engenharia e Serviços – GES Consult ATIVIDADES QUE EXERCEU: - Engenheiro da Companhia Energética de Alagoas (CEAL), por 28 anos - Diretor de Operação da Companhia de Eletricidade de Alagoas - CEAL - Secretário de Administração da Prefeitura Municipal de Maceió - Assessor de Coordenação e Planejamento da Empresa de Recursos Naturais do Estado de Alagoas - EDRN - Chefe de Gabinete da Diretoria de Desenvolvimento Energético da CEAL - Assessor da Subcomissão de Minas e Energia do Senado Federal - Diretor de Distribuição e Comercialização da Companhia Energética de Alagoas - CEAL - Consultor em eficiência energética do PNUD / ELETROBRÁS - Secretário Executivo do Núcleo de Eficiência Energética na Indústria (NEEI / FIEA) - Secretário Executivo do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas - CEPE - Secretário de Estado Adjunto de Energia e Recursos Minerais de Alagoas - Vice-Presidente de Planejamento Energético do Fórum Nacional dos Secretários de Estado para Assuntos de Energia - FNSE - Representante da Região Nordeste no Conselho Consultivo da Empresa de Pesquisa Energética – EPE - Diretor Presidente da Gás de Alagoas S.A. – ALGÁS - Vice-Presidente do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas – CEPE - Presidente do Conselho Fiscal da ABEGÁS – Associação Brasileira das Empresas das Empresas Distribuidoras de Gás Natural – ABEGÁS - Professor nas disciplinas de Eletricidade e Eletrotécnica, no Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Alagoas – UFAL - Membro do Conselho Estadual de Política Energética – CEPE LIVROS E TRABALHOS PUBLICADOS: - Protestos e Propostas (EDUFAL) - Energia: Um Mergulho na Crise (IGASA) - Política e Modelagem do Setor Elétrico (Imprensa Oficial GRACILIANO RAMOS) - Espírito Cidadão (EDUFAL) - Vários trabalhos sobre energia publicados nos anais de Seminários, Congressos Nacionais e Revista Internacional

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *