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Pressão Alta no Brasil: Por Que a Ancestralidade Importa? Estudo Revela Disparidades Surpreendentes

Um Olhar Inesperado Sobre a Pressão Alta

Por Dr. Luiz Guilherme Almeida

Olá sapins!

Você já parou para pensar que a sua ancestralidade poderia influenciar o controle da sua pressão arterial? Parece um detalhe, mas um grande e recente estudo brasileiro, o “Self-Declared Color and Hypertension” do autor principal Maicon Borges Euzébio e colaboradores, publicado nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, trouxe à tona dados importantes e, de certa forma, surpreendentes sobre esse tema. Hoje, vou compartilhar com vocês o que essa pesquisa descobriu e o que isso significa para a nossa saúde.

Pressão Alta no Brasil: Por Que a Ancestralidade Importa? Estudo Revela Disparidades Surpreendentes

Dr. Luiz Guilherme Almeida

Ponto 1: O Controle da Pressão é Diferente. E os Números Mostram Isso.

A principal descoberta do estudo é direta: a prevalência de hipertensão não controlada é maior entre os afrodescendentes no Brasil. Para este estudo, os pesquisadores agruparam os participantes que se autodeclararam pretos como ‘afrodescendentes’, e os que se autodeclararam brancos, pardos ou amarelos como ‘não afrodescendentes’. Os dados são claros e mostram uma diferença significativa:

* Afrodescendentes: 54,6% com pressão não controlada.
* Não afrodescendentes: 44,7% com pressão não controlada.

Essa diferença de quase 10% é estatisticamente relevante. E esse descontrole não é apenas um número; ele se traduz em um risco aumentado de eventos graves como infarto, AVC e doença renal, o que nos faz questionar quais fatores estão por trás desse cenário na saúde da população brasileira.

Ponto 2: Médicos Receitam Remédios Diferentes Para Grupos Diferentes

Outro ponto interessante que a pesquisa notou foi uma variação nos tipos de medicamentos mais prescritos pelos médicos para cada grupo. A abordagem terapêutica não foi a mesma.

* Para afrodescendentes: O medicamento mais comum foi o diurético tiazídico, usado por 52% do grupo.
* Para não afrodescendentes: O mais comum foi o bloqueador de receptor de angiotensina (BRA), usado por 47,6% do grupo.

Essa diferença não é aleatória. Diretrizes médicas internacionais e brasileiras frequentemente recomendam diuréticos como os tiazídicos como uma primeira linha eficaz para a população afrodescendente, enquanto os BRAs são uma escolha comum e eficaz para a população em geral. O estudo confirma que essa recomendação se reflete na prática.

Ponto 3: Não é Só Genética, o Fator Social Pesa Mais

E aqui chegamos ao ponto mais revelador do estudo. Poderíamos pensar que a diferença no controle da pressão estaria na escolha do medicamento, mas os pesquisadores apontam para uma direção muito mais profunda: o fator social. A análise sugere que as barreiras no acesso à saúde, as condições de vida e a falta de educação em saúde têm um impacto mais significativo no controle da hipertensão do que a classe específica de remédio utilizada. Isso muda o foco da biologia para a equidade. Essa conclusão é tão forte que ecoa os achados de outros grandes estudos brasileiros, como o ELSA-Brasil, que também apontam para os determinantes sociais como peças-chave na saúde cardiovascular da nossa população.

Ponto 4: Pressão Sistólica, Diastólica e IMC Também São Mais Elevados

Além da diferença no controle, o estudo mostrou que os valores médios de pressão e o Índice de Massa Corporal (IMC) também foram mais altos nos participantes afrodescendentes. A tabela abaixo resume bem essa diferença nos valores medianos:

Pressão Alta no Brasil: Por Que a Ancestralidade Importa? Estudo Revela Disparidades Surpreendentes

Indicador Afrodescendentes Não afrodescendentes
Pressão Sistólica (SBP) 140 mmHg 132 mmHg
Pressão Diastólica (DBP) 85.5 mmHg 80.0 mmHg
IMC (Kg/m²) 29.4 28.4

(Lembre-se: a pressão sistólica é a força do sangue nas artérias quando o coração bate, o ‘número maior’; a diastólica é a força quando o coração descansa, o ‘número menor’). Na prática, esses valores medianos mais altos significam que, em média, o coração e as artérias da população afrodescendente no estudo estão trabalhando sob uma carga de estresse consistentemente maior, o que reforça a observação de um maior risco cardiovascular nesse grupo.

Conclusão: O Que Fazemos com Essa Informação?

O estudo nos deixa com uma certeza: existem disparidades claras na saúde cardiovascular entre diferentes grupos étnicos no Brasil. Essas diferenças são complexas e envolvem uma mistura de fatores sociais, de acesso à saúde e de tratamento. A informação é um passo crucial para entendermos melhor a saúde da nossa população e buscarmos soluções mais justas e eficazes. Fica a questão para nossa reflexão: como podemos, enquanto sociedade, trabalhar para que todos tenham as mesmas oportunidades de controlar a pressão e proteger o coração?

Cuide-se.

Pressão Alta no Brasil: Por Que a Ancestralidade Importa? Estudo Revela Disparidades Surpreendentes

Luiz Guilherme Almeida

Saúde e Bem-estar Luiz Guilherme Almeida (CRM/AL 6134 | RQE 3731) Atualmente é Presidente da Regional Alagoas da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, conselheiro regional de medicina em Alagoas CREMAL (2018 a 2023 / 2023 a 2028), associado n 28523 da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Diretor Sócio Cultural e Intercâmbio (2020 a 2023) e Conselheiro Científico (2023 a 2026) da Sociedade de Medicina de Alagoas (SMA - AMB-AL), federada à Associação Médica Brasileira. Consultor Científico do Instituto Mundaka, para estudo de terapias com cannabis medicinal e fármacos psicodélicos. Tem experiência em terapia intensiva, área que atua desde 2002, e Nefrologia com ênfase em Hipertensão Arterial e Doença Renal do Diabetes. Ambulatório de Nefrologia e Hipertensão do Hospital do Coração Alagoano Professor Adib Jatene, CEO da W Life sapiens center, representante de Alagoas no Departamento de Hipertensão Arterial da Sociedade Brasileira de Cardiologia DHA SBC (2020 a 2024). Possui Título de Especialista em Nefrologia pela Sociedade Brasileira de Nefrologia SBN/AMB e em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica SBCM/AMB.

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