20 / 06 / 11

Uma noite inesquecível com Paul McCartney! “The Up and Coming Tour”

Imagens: divulgação

Meus queridos amigos leitores, muito boa noite!

Já passa da meia-noite desta quarta-feira, e estou aqui no meu estúdio, começando a escrever esta nova matéria. Faz um frio maravilhoso no Rio de Janeiro, as noites com chuva e frio são embaladas com sopas muito quentes e generosas taças de vinhos. Pensei muito para fazer esta matéria, e cheguei à conclusão de que não poderia escrever nada que não fosse contar aqui para vocês um pouco do que vivi, vendo o show maravilhoso de Sir Paul McCartney no Rio de Janeiro. Para os que estão me lendo agora e não puderam ou não tiveram a oportunidade de assistir a esse grande show, eu posso dizer que realizei um grande sonho, pois vi ali, naquela noite de domingo, no Engenhão, um “Beatle”. Foi uma noite inesquecível, onde sobraram o talento de Paul e sua vigorosa banda e a emoção total da plateia.

Na primeira vez que Paul McCartney veio ao Brasil, naquele show memorável no Maracanã, em abril de 1990, e que bateu o incrível recorde de público em uma apresentação de um artista solo (184 mil pessoas), entrando para o Guiness Book, eu, infelizmente, não pude vê-lo, porque tocava com Fagner naquela época, e na semana do show fomos fazer uma turnê no sul do Brasil, começando por Porto Alegre. Não posso esconder dos amigos leitores que tive muita dificuldade de entrar naquele avião para Porto Alegre, nunca tinha me atrasado em um voo, nem muito menos perdido um avião, mas que eu pensei muito antes de entrar naquela aeronave, ah! Isso eu pensei. Como eu vou viajar e deixar de assistir ao show de um dos músicos mais importantes do planeta? Do músico que, junto a John, George e Ringo, foi a minha maior influência para que eu viesse a me tornar músico… Como deixar de ver esse show tão fantástico? Bem, como para mim música é coisa muito séria, o profissionalismo falou mais alto, e o Fagner precisava muito de mim em sua banda, entrei naquele avião, solicitei à aeromoça uma dose dupla de Whisky e acordei em Porto Alegre. Mas passados 21 anos após esse episódio, pude, enfim, assistir a uma verdadeira aula de como se faz um mega-show, com uma equipe muito competente, som e luz impecáveis, um super palco, e dois telões gigantescos, que permitiam a todos que estavam no Engenhão acompanhar os gestos e as expressões de Paul e sua magnífica banda.

Sir Paul McCartney

Sir Paul McCartney

Quando Paul McCartney subiu ao palco, às 21h43 de domingo, e começou a cantar “Hello Goodbye”, a maioria das 45 mil pessoas que lotaram o Engenhão já sabia quase tudo que aconteceria em “The Up and Coming Tour”, do repertório, até as possíveis falas em bom português (sempre esbanjando simpatia), passando pelas belas imagens no telão.

Caros amigos, quando se trata de um músico do quilate de um Beatle, quando se fala de Paul McCartney, um artista que nem parece ter os seus bem vividos 68 anos de idade, a coisa muda totalmente de figura. Porque uma das coisas que acho excitante, quando vou subir ao palco para me apresentar, é todo o ritual que o show nos oferece, que nos envolve, como chegar cedo ao local para reconhecer o lugar, a passagem de som, os camarins… E é aqui que eu queria chegar: a lista das músicas, o “setlist”, como chamamos nos bastidores. Vocês podem imaginar como um artista como Paul, que além de ter uma muito bem-sucedida carreira solo, fez parte da maior banda de Rock de toda a história do planeta, com um baú de “hits” de perder a conta; vocês podem imaginar como deve ser difícil para Paul McCartney ter que escolher o seu roteiro? O seu setlist? Sim, porque, na verdade, nós poderíamos ficar ali no Engenhão alguns dias, com Paul e sua banda tocando para nós todos, que estaria tudo divino e maravilhoso, como diria o nosso querido Caetano Veloso. Esse senhor inglês de 68 anos de idade, canhoto, é uma verdadeira fábrica de “hits”. Com tantos sucessos na manga, Paul será sempre “hors-concours”. O que vai mudar de uma noite histórica para a outra é justamente a forma como esses diamantes serão lapidados e oferecidos ao público. Nesse ponto, a noite de domingo foi perfeita para mim e para os amigos que estavam ao meu lado. Tive ainda a emoção de assistir ao show com meu filho mais velho, que estava super a fim de ver Paul McCartney, e consegui satisfazer a sua vontade. Ponto pra mim, então!

Na turnê que trouxe o ex-Beatle ao Brasil, em 1990, ele tinha uma banda excelente e contava com o apoio nos teclados de sua ex-mulher, a doce Linda McCartney, mas em “The Up and Coming Tour”, eu devo admitir que a banda atual me agrada muito. Na minha opinião, deu uma renovada no som do músico – nada que vá mudar os arranjos ou a parte harmônica, até porque quem é realmente fã de Beatles não vai estar ali para ouvir arranjos mirabolantes, coisas totalmente diferentes do que se ouve nas gravações originais; mas vejo nessa banda uma energia nova, pulsando a cada música. É realmente uma banda vigorosa, que tem na bateria do incrível e engraçadíssimo Abe Laboriel Jr., o caçula de 39 anos, um verdadeiro dínamo em termos de ritmo, o coração da banda. Abe é filho do famoso músico de estúdio Abraham Laboriel, e está com Paul McCartney desde 2001. Antes de entrar para a banda de Paul, Abe já tinha tocado com Steve Vai, Seal e KD Lang. Nos teclados, está o mais antigo da banda, o extraordinário multi-instrumentista Paul “Wix” Wickens. Wix é responsável por reproduzir no palco toda aquela sofisticada orquestração que nós fomos acostumados a ouvir nos discos dos Beatles, com os arranjos do espetacular produtor e arranjador, o genial George Martin, que eu tive o grande prazer de conhecer quando ele esteve no Brasil. Wix está nos palcos com Paul há 21 anos, é o único músico remanescente da antiga banda do ex-Beatle. Atualmente, Wix é o diretor musical da banda. E nas guitarras, a chapa esquenta mesmo, como se diz nos bastidores. Temos Rusty Anderson, guitarrista americano de 51 anos, com respeitável currículo como músico de estúdio, convidado a ingressar a banda de Paul em 2001. Entre os artistas com quem trabalhou, estão Elton John, Willie Nelson, Jewel e Joe Cocker, só para citar alguns. Na outra guitarra, está o americano Brian Ray, de 55 anos, que se encaixou muito bem na banda, desde 2001. Além de ser muito bom guitarrista, Brian ainda acumula (e muito bem, por sinal) a função de baixista, quando Paul larga o baixo e vai para o piano ou para a guitarra. Como seu amigo Anderson, Ray se sai muito bem nas duas funções que ocupa.

A superbanda de Paul

A superbanda de Paul

Amigos, além dos sucessos dos Beatles, o que teve de bom no repertório foi o fato de Paul ter tocado algumas músicas de “Band on the Run”, do Wings, banda que formou logo após o término dos Beatles. Paul nos brindou com a espetacular “Jet”, além das menos conhecidas “Mrs. Wanderbilt” e a pesadíssima “Let Me Roll It”, em que, mais uma vez, destaca-se a energia magnífica de Abe Laboriel Jr.

Capa de "Band on the Run", do Wings

Capa de "Band on the Run", do Wings

Esbanjando simpatia para um cara que poderia, se não fosse a boa cabeça, ser um dos mais arrogantes do mundo, Paul se esforçou para falar em bom português ao seu público. “Olá, cariocas! Tudo bem?”, para o delírio das 45 mil pessoas que lotavam o Engenhão. Antes de cantar a belíssima “Blackbird”, dos Beatles, Paul lembrou que compôs a canção em meio ao calor da luta pelos direitos civis e igualdade racial nos Estados Unidos, nos anos de 1960. Seguindo o roteiro, o presidente americano Barack Obama aparece no telão no começo da música “Sing the Changes”. Outras homenagens estariam por vir, e foram muito bem recebidas pela plateia, como em “Here Today”, quando McCartney lembrou do eterno companheiro John Lennon, emocionando a todos. Uma coisa me chamou a atenção em “Here Today”: mesmo sendo uma bela homenagem a John, que, junto a Paul, fez parte da dupla mais bem-sucedida do planeta, pude notar que não apareceu em nenhum momento a imagem de John no telão. Confesso que achei estranho. Isso eu não posso confirmar com precisão, mas comenta-se que a viúva de John Lennon, a Sra. Yoko Ono, tenha proibido de ter qualquer imagem de John sozinho no show. Não quero emitir uma opinião pessoal aqui para os amigos leitores, e nem mesmo influenciá-los, mas tenho que admitir que, como fã dos Beatles que sou, tenho uma tremenda antipatia por Yoko Ono. De alguma forma, sempre atribuí a ela a responsabilidade pelo fim dos Beatles, pela maneira como ela visivelmente interferiu na maior banda de todos os tempos, querendo sempre aparecer, inclusive no filme de “Let It Be”. Para mim, aquelas imagens dela em Abbey Road são constrangedoras. Mas deixando a Sra. Ono e a polêmica que envolve sua imagem de lado, voltemos a outro grande momento do show: a belíssima homenagem, essa muita mais explícita, a George Harrison, que, para a nossa alegria, surgiu no telão ao fundo do palco durante a bela versão de “Something”. Foi um momento mágico do show, e certamente Olivia Harrison não negaria um momento como esse a Paul e seus fãs.

Paul, George e Ringo

Paul, George e Ringo

Os sucessos continuaram noite adentro, como em “Drive My Car”, a belíssima e eterna “The Long and Winding Road”. Em “Hey Jude”, o público carioca nos brindou com cartazes com o solfejo do refrão “Na na na”, fazendo um climaço na noite. Em “Live and Let Die”, tivemos o momento máximo do show, apoteótico de explosões e lindíssimos fogos de artifício, deixando o Engenhão iluminado de cores mágicas. Chegando ao fim, veio a hora que eu particularmente tanto esperava: os dois “bis”, com “Day Tripper” seguido de “Get Back”, e a minha predileta, acho que a música que eu mais gosto na vida, não querendo ser injusto com tantas canções lindas em todo o mundo, mas talvez “Nessun Dorma”, de Giacomo Puccini, e “Yesterday”, dos Beatles, sejam as duas músicas que mais amo no mundo. Quando vi Paul McCartney pegar o violão depois de tocar “Get Back”, eu falei para meu filho, Luca, “Ele vai tocar ‘Yesterday’ agora, filho!” E foi isso mesmo que aconteceu. Nos primeiros acordes, escutei aquela pérola de canção, sempre muito bem executada pelo muiti-instrumentista Paul “Wix” Wickens, que mais uma vez se sobressaiu, executando fielmente o arranjo do fantástico e genial George Martin. Para arrebentar a noite, Paul fecha o “bis” com a metálica música do Álbum Branco “Helter Skelter”, ensinando como se faz um verdadeiro Rock pesado, e levando mais uma vez o público ao delírio. Paul agradece e vem com a banda para frente do palco saudar a plateia, àquela altura em êxtase, e vão embora, saem do palco, mas as luzes não se apagam, e as 45 mil pessoas que lotavam o Engenhão não vão embora, e aplaudem sem parar. E de repente surge no palco novamente Paul e sua exuberante banda. Paul ainda pergunta em tom de brincadeira: “Vocês não querem ir pra casa?” Com a euforia do público, Paul e banda atacam de “Sgt. Pepper”. Lembrei-me de meus 11 anos, quando essa música foi lançada, e ganhei de minha madrinha, Sueli Stambowsky, o LP “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Naquela noite, amigos, quando saí de casa rumo ao Engenhão, deixei meu ego de artista do lado de fora do estádio. Ali, eu era um autêntico fã daquela usina sonora, do que representa e representou para mim a música dos Beatles e a música de Paul McCartney. Cantei, dancei, brinquei com a luz de meu celular para iluminar o estádio, me emocionei em muitas músicas, como “Yesterday”, e agradeci muito por estar ali, vendo um mito da música, uma lenda que embalou a história de muitos de nós com tantas belas canções. Agradeci por ter nascido nessa geração que cresceu ouvindo a música dos Beatles. Tudo isso, meus queridos amigos leitores, quando já passava dos 20 minutos de segunda-feira, e vi Paul McCartney e essa incrível banda saírem do palco rumo ao hotel para, enfim, dormirem, depois de emocionar a 45 mil pessoas, que foram em paz e êxtase para casa.

Arte da capa de "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band"

Arte da capa de "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band"

Parabéns a Paul McCartney, esse garoto de 68 anos de Liverpool, e a sua equipe, e parabéns também à Plan Music, do nosso competentíssimo Luiz Oscar Niemeyer, pela produção impecável, pela organização em torno do estádio, pelos transportes que funcionaram, e mais, pelo público, que deu um show de educação e civilidade. Não houve empurrões na saída, gente falando alto, brigas ou qualquer clima pesado, muito pelo contrário: o que se viu na saída de “The Up and Coming Tour”, o clima era de felicidade entre as pessoas, as famílias que foram ali para ouvir e ver um verdadeiro Beatle, e fiz uma pergunta para mim mesmo, inevitável: Por que o mundo do futebol, que tanto amo, e que é uma outra paixão em minha vida, não pode ser assim nos estádios? Por quê? Mas isso é uma outra história, não é mesmo, amigos? E fica para uma outra conversa.

Beijos, abraços, e até a próxima!

Beto Saroldi

Beto Saroldi - Rio de Janeiro/RJ

Saxofonista, compositor e produtor musical, começou sua carreira em 1975 com Eduardo Dusek e desde cedo foi muito requisitado nos estúdios, gravando com Fafá de Belém, Zizi Possi, Capital Inicial, Barão Vermelho, Gilberto Gil, Toquinho, Lulu Santos e muitos outros astros da MPB. Fez parceria com Erasmo e Roberto Carlos, tocou com Wagner Tiso & Lô Borges e ainda pertenceu a "UmBandaUm" de Gilberto Gil, fazendo turnês pelo Brasil, EUA, Europa, América Central e Oriente Médio.

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