05 / 06 / 25

VORACIDADE ELÉTRICA

VORACIDADE ELÉTRICA

Os analistas de energia sempre pensaram que o aumento da demanda global de energia seria impulsionado pela industrialização e pelo crescimento populacional, mas não é o que tem sido observado nos últimos dois anos. Esse impulso já dá sinais que as empresas de tecnologia serão esse carro-chefe, haja vistas o lançamento de complexas tecnologias como inteligência artificial (IA) e aprendizado de máquina. Essa tendência já foi confirmada em uma pesquisa realizada pela consultoria McKinsey, que detectou 72% das empresas pesquisadas usando IA em pelo menos uma de suas funções comerciais.

          Alimentar essas tecnologias complexas com energia não é simples. Uma solicitação feita por IA utiliza muito mais energia elétrica do que uma pesquisa típica pela internet. A Electric Power Research Institute, empresa de pesquisa para fins específicos, diz que uma solicitação feita através do ChatGPT usa 2,9 watts-hora, quando pela internet uma consulta tradicional gasta 0,3 watts-hora. Assim, se a IA passar a ser integrada a todos os aspectos de nossas vidas online, deveremos ter na próxima década um enorme crescimento da demanda de energia.

          Os investidores globais em data centers estão ampliando a sua capacidade de processamento e armazenamento de dados para suportar o avanço da inteligência artificial no mundo. A IA e a inteligência artificial generativa (GenIA) vão aumentar em 160% o consumo de energia elétrica dos data centers até 2027, mas o que se avalia é que 40% deles estarão limitados pela disponibilidade de energia. As centrais convencionais atuais têm densidade de potência de 4 a 10 kW/rack e as futuras vão exigir 30 a 100 kW/rack. Nesse período, a projeção para eles operarem os seus servidores otimizados para IA vão demandar 500 TWh em 2027, o que significa 2,6 vezes mais do que o nível de 2023.

          Existem dois tipos de instalação de data centers: inferência e treinamento. Os data centers de inferência são aqueles que possuem os algoritmos da IA para atendimento das interações dos usuários nos chats. Os de treinamento são aqueles responsáveis pelo recebimento e tratamento de todas as informações dos data centers de inferência, para aperfeiçoar os algoritmos e devolvê-los para que sejam tomadas as providências de modificações. Além de serem os data centers que demandam maior quantidade de energia, os de treinamento possuem outra característica fundamental: não requerem latência crítica, podendo assim serem instalados em qualquer lugar do mundo, distantes dos usuários.

          Até 2030, a demanda de energia por data centers nos EUA deve atingir 606 terawatts-hora (TWh), o equivalente a 11,7% da demanda total de energia naquele país. Essa demanda por energia em 2023 foi de 147 TWh e fez com que as grandes empresas de tecnologia passassem a fazer parcerias com as empresas de energia para desenvolver suas próprias fontes de alimentação dedicadas, deixando de lado as redes das concessionárias. A rigor, os data centers não podem ficar nem um segundo sem energia. Outro desdobramento dessa postura é que, tanto os governos como os consumidores, pedem diariamente que as empresas sejam socialmente mais responsáveis, o que pode impulsionar essas grandes da tecnologia a investir na capacidade de energia limpa para alimentar suas operações. Nos anos de 2023 e 2024 o setor de tecnologia foi responsável por mais de 68% dos 200 negócios de capacidade renovável.

          Nos EUA há uma demora de 5 a 8 anos para haver a conexão na rede da concessionária e as agências reguladoras estão sugerindo que as empresas gerem a sua própria energia. A Microsoft tenta viabilizar a sua geração com gás natural e captura de carbono. A Google e a Amazon optaram pela energia nuclear modular. A startup chinesa HiCloud já inaugurou um data center subaquático, para gastar menos energia com refrigeração. Outras empresas de tecnologia estão estudando apoiar sua expansão em energia renovável, fazendo testes e dimensionando tecnologias de energias promissoras, geotérmica avançada, tecnologias eólicas e solares avançadas e energia hidrelétrica. O que ainda não está claro e se essas grandes empresas de tecnologia vão impulsionar os seus crescimentos em combustíveis fósseis, energias renováveis ou energia nuclear.

          A energia consumida por um data center moderno pode fazer o suprimento de uma cidade com 80 mil consumidores. Na Europa, existe uma restrição para novas conexões de data centers, com a maioria dos países priorizando o consumo de energia pela população. Em Portugal, a solicitação é para 1,2 GW. Na Holanda o governo não permite instalações de data centers. Essa é uma grande oportunidade de curto prazo para o Brasil, pois temos uma potência instalada de 244 GW para uma demanda média de 85 GW e máxima registrada de 102 GW no 1º trimestre deste ano. A maioria dessa disponibilidade é de fonte renovável e energia de baixo custo, condições fundamentais que são observadas pelos investidores.

          Atualmente, temos mais de 130 data centers em operação no Brasil e, segundo dados da Associação Brasileira de Data Centers (ABDC), temos uma base instalada de 800 MW e um planejamento para instalação de 1.659 MW, sendo que 186 MW já estão em construção. No Ministério de Minas e Energia (MME) existem pedidos de conexão à rede básica de 9 GW para cargas de data centers e os pedidos de conexão são nos estados de Bahia, Ceará, Rio Grande do Sul e São Paulo.

          O eixo do poder está se deslocando dos produtores de petróleo e gás para países detentores de recursos e tecnologia das cadeias de valor de energias de baixo carbono. O Brasil tem a maior disponibilidade hídrica do mundo, é o segundo maior produtor de energia hidrelétrica, segundo maior produtor de biocombustíveis, maior produtor de etanol de cana-de-açúcar, terceiro maior produtor de biodiesel, oitavo maior produtor de petróleo e reconhecido líder produtor e exportador de commodities minerais, domina o ciclo completo do enriquecimento do urânio, razão pela qual é posicionado como uma das principais potências energéticas do mundo. O PNE 2055 leva muito em consideração as mudanças geopolíticas como reflexo da aceleração da transição energética e o que se impõe no planejamento energético nacional é a necessidade de resiliência e segurança energética. (Valor Econômico, em 19/05/2025)

VORACIDADE ELÉTRICA
Por Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e Serviços

 

Geoberto Espírito Santo

SinergiaGeoberto Espírito Santo é Engenheiro Civil, formado em 1971 pela Universidade Federal de Alagoas. Atualmente é Consultor do SINDENERGIA – Sindicato das Indústrias de Energia do Estado de Alagoas e Personal Energy da GES Consultoria, Engenharia e Serviços – GES Consult ATIVIDADES QUE EXERCEU: - Engenheiro da Companhia Energética de Alagoas (CEAL), por 28 anos - Diretor de Operação da Companhia de Eletricidade de Alagoas - CEAL - Secretário de Administração da Prefeitura Municipal de Maceió - Assessor de Coordenação e Planejamento da Empresa de Recursos Naturais do Estado de Alagoas - EDRN - Chefe de Gabinete da Diretoria de Desenvolvimento Energético da CEAL - Assessor da Subcomissão de Minas e Energia do Senado Federal - Diretor de Distribuição e Comercialização da Companhia Energética de Alagoas - CEAL - Consultor em eficiência energética do PNUD / ELETROBRÁS - Secretário Executivo do Núcleo de Eficiência Energética na Indústria (NEEI / FIEA) - Secretário Executivo do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas - CEPE - Secretário de Estado Adjunto de Energia e Recursos Minerais de Alagoas - Vice-Presidente de Planejamento Energético do Fórum Nacional dos Secretários de Estado para Assuntos de Energia - FNSE - Representante da Região Nordeste no Conselho Consultivo da Empresa de Pesquisa Energética – EPE - Diretor Presidente da Gás de Alagoas S.A. – ALGÁS - Vice-Presidente do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas – CEPE - Presidente do Conselho Fiscal da ABEGÁS – Associação Brasileira das Empresas das Empresas Distribuidoras de Gás Natural – ABEGÁS - Professor nas disciplinas de Eletricidade e Eletrotécnica, no Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Alagoas – UFAL - Membro do Conselho Estadual de Política Energética – CEPE LIVROS E TRABALHOS PUBLICADOS: - Protestos e Propostas (EDUFAL) - Energia: Um Mergulho na Crise (IGASA) - Política e Modelagem do Setor Elétrico (Imprensa Oficial GRACILIANO RAMOS) - Espírito Cidadão (EDUFAL) - Vários trabalhos sobre energia publicados nos anais de Seminários, Congressos Nacionais e Revista Internacional

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *