06 / 02 / 24

A TENSÃO ALTA

A TENSÃO ALTA

O reajuste das tarifas da Equatorial Amapá para 2024 havia sido definido pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) em 44,1%. É claro que é um aumento exorbitante, mas está de acordo com as regras atualmente vigentes aplicadas ao setor. O Amapá é o líder no ranking dos consumidores inadimplentes no Brasil, estado em que o nível de endividamento da população é de 52,86%, tem em 12,4% a terceira maior taxa de desemprego, com 65% das famílias em situação de pobreza e, em 2021, ocupava a 25ª posição no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Um reajuste desse porte é de pagamento insuportável e o Governo acenou com uma ajuda de R$ 350 milhões, via MP (Medida Provisória), para também propor reajustes iguais em todo o país.

Em um evento na cidade de Macapá, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, sem nenhum detalhe, um investimento de R$ 350 milhões para o Amapá poder redempréstimos feitos às distribuidoras para enfrentarem a crise hídrica de 2021; no mercado livre estão 3 milhões de consumidores que consomem 45% da energia do país e pagam R$ 250/MWh, enquanto os demais 87 milhões de consumidores pagam a uzir esse aumento de 44,1%. Em seu discurso, o ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, fez as seguintes citações para as causas desse aumento desproporcional: empréstimos feitos às distribuidoras por conta da Covid-19 (Conta Covid); média de R$ 650/MWh às distribuidoras.

O Presidente Lula também criticou o preço da energia elétrica no mercado livre, utilizado pelas empresas, por ser um terço do valor que é pago pelo “povo pobre” que tem tarifas reguladas no mercado cativo. Disse que vai convocar uma reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) para pensar no que chamou de “nova fase de pagamento de energia” e arrematou: “Não é justo o mais rico pagar menos da metade do valor da energia. Eu disse que o governo terá que se debruçar no começo do ano e resolver esse negócio de energia porque o pobre e trabalhador não pode pagar a conta dos mais ricos do país”. Nenhuma menção foi feita sobre o peso dos subsídios, que deveriam ser custeados pela União, e que estão sendo pagos pelo consumidor de energia elétrica.

De acordo com um mapeamento feito pela ANEEL ao final de 2023, os subsídios ao setor de elétrico totalizaram R$ 32,97 bilhões, com um montante representativo de 13,21% que cai na conta de luz dos brasileiros. Esse valor é um pouco inferior ao registrado em 2022, quando totalizou R$ 33,5 bilhões. Os principais dados desse mapeamento feito pela Agência Reguladora e são os seguintes: a tarifa residencial média ficou em R$ 731,37/MWh, sendo que a parcela referente aos encargos é de R$ 96,63/MWh; as fontes incentivadas lideraram os valores acumulados chegando muito perto dos R$ 9,6 bilhões, o que representa 29% dos subsídios totais e os consumidores pagaram R$ 7,3 bilhões desse valor; a CCC (Conta de Consumo de Combustíveis) soma um pouco mais de R$ 8,3 bilhões, o que representa 25,2% do total de subsídios; a GD (Geração Distribuída) representou R$ 6,4 bilhões, sendo que 54% foi pago pelos consumidores; a Tarifa Social, que é o subsídio dado aos consumidores de baixa renda, reuniu R$ 4,7 bilhões totalmente custeados pelo restante dos consumidores; existem ainda subsídios de menor monta para a irrigação e aquicultura, água-esgoto-saneamento, carvão e óleo combustível, consumidor rural, distribuidoras de pequeno porte e programas de universalização (Mais Luz para a Amazônia, Luz para Todos, kit instalação).

Até para os que conhecem um pouco como funciona o setor elétrico brasileiro, as declarações do Ministro, do Presidente da República e essa proposta de reajustes iguais para empresas, cujos são custos diferentes, causam preocupações. Numa comparação simplista, dão a entender que o mercado livre é prejudicial ao consumidor. As tarifas de energia elétrica não são definidas por livre e espontânea vontade da ANEEL, mas em decorrência de uma legislação que embasa as premissas e os cálculos técnicos a serem adotados, tudo em função das condições da distribuidora e de sua área de concessão. O fórum para resolver essas questões em prol do povo brasileiro é o entendimento entre o Congresso Nacional e o Governo, um que aprova leis e o outro que sanciona. O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) é apenas um órgão de assessoramento. Qual a origem dos R$ 350 milhões e como serão feitos esses pagamentos não foram sequer citados, o que é muito grave, não só pela falta de transparência, como também pela forma como foi feito, com apelo populista num evento que não tinha esse propósito. Uma decisão dessa forma, abre um precedente perigoso para que outros estados ou até mesmo as distribuidoras que se encontrarem em situações delicadas ou com as concessões de distribuição em condições precárias, venham acionar Brasília para enfrentar seus problemas.

Para 2024, segundo cálculos da consultoria Thymos Energia, o acréscimo médio será de 4,8% menor que as taxas médias de aumento em 2022 (12,96%) e em 2023 (10,85%) e que teve como principal consequência os valores muito baixos do Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) ao longo de 2023, permanecendo quase sempre no piso mínimo estabelecido de R$ 69,04/MWh. O PLD reflete o preço da energia no mercado de curto prazo, mas seus valores impactam no médio e longo prazo. Em 2023 tivemos uma hidrologia favorável aos custos baixos e um bom desempenho das renováveis, não tendo sido necessário recorrer às usinas térmicas do sistema de reserva, que são mais custosas. Assim, a bandeira verde foi mantida ao longo do ano, sem custos adicionais no bolso do consumidor, o que não deve acontecer em 2024 haja vista as ocorrências climáticas que já apareceram no início deste ano.

A consultoria TR Soluções fez um estudo focado nos consumidores residenciais e concluiu que o aumento médio em 2024 vai ser de 7,61%. Considerou a média dos reajustes de cada uma das 51 concessionárias de distribuição do país, que foram ponderados com os seus respectivos mercados. Esse percentual de aumento para os consumidores residenciais é um valor médio, quando a maioria das concessionárias deve apresentar um reajuste de 11,5%, sendo que 8 distribuidoras vão representar uma redução em relação a 2023 e 9 delas terão um aumento maior que a média, cerca de 14%.

A ANEEL citou algumas razões para essas estimativas do reajuste médio em 2024 nas tarifas de energia elétrica: aumento da extensão da rede de energia, em decorrência do crescimento natural da economia do país; e os encargos setoriais, que são definidos pelo Governo e pelo Congresso Nacional. A estimativa da ANEEL para o reajuste tarifário de 2024 é uma média de 5,6% acima de 3,86% (IPCA). No ano passado, a estimativa da ANEEL foi de um reajuste médio de 6,8% e o efetivamente registrado de 5,9%.

A TENSÃO ALTA
por Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e Serviços

Geoberto Espírito Santo

SinergiaGeoberto Espírito Santo é Engenheiro Civil, formado em 1971 pela Universidade Federal de Alagoas. Atualmente é Consultor do SINDENERGIA – Sindicato das Indústrias de Energia do Estado de Alagoas e Personal Energy da GES Consultoria, Engenharia e Serviços – GES Consult ATIVIDADES QUE EXERCEU: - Engenheiro da Companhia Energética de Alagoas (CEAL), por 28 anos - Diretor de Operação da Companhia de Eletricidade de Alagoas - CEAL - Secretário de Administração da Prefeitura Municipal de Maceió - Assessor de Coordenação e Planejamento da Empresa de Recursos Naturais do Estado de Alagoas - EDRN - Chefe de Gabinete da Diretoria de Desenvolvimento Energético da CEAL - Assessor da Subcomissão de Minas e Energia do Senado Federal - Diretor de Distribuição e Comercialização da Companhia Energética de Alagoas - CEAL - Consultor em eficiência energética do PNUD / ELETROBRÁS - Secretário Executivo do Núcleo de Eficiência Energética na Indústria (NEEI / FIEA) - Secretário Executivo do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas - CEPE - Secretário de Estado Adjunto de Energia e Recursos Minerais de Alagoas - Vice-Presidente de Planejamento Energético do Fórum Nacional dos Secretários de Estado para Assuntos de Energia - FNSE - Representante da Região Nordeste no Conselho Consultivo da Empresa de Pesquisa Energética – EPE - Diretor Presidente da Gás de Alagoas S.A. – ALGÁS - Vice-Presidente do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas – CEPE - Presidente do Conselho Fiscal da ABEGÁS – Associação Brasileira das Empresas das Empresas Distribuidoras de Gás Natural – ABEGÁS - Professor nas disciplinas de Eletricidade e Eletrotécnica, no Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Alagoas – UFAL - Membro do Conselho Estadual de Política Energética – CEPE LIVROS E TRABALHOS PUBLICADOS: - Protestos e Propostas (EDUFAL) - Energia: Um Mergulho na Crise (IGASA) - Política e Modelagem do Setor Elétrico (Imprensa Oficial GRACILIANO RAMOS) - Espírito Cidadão (EDUFAL) - Vários trabalhos sobre energia publicados nos anais de Seminários, Congressos Nacionais e Revista Internacional

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