11 / 07 / 22

CHOQUE DE SUBSÍDIOS

“O mundo não será salvo pelos caridosos, mas pelos eficientes.” (Roberto Campos)

 

CHOQUE DE SUBSÍDIOS

A CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) foi criada pela Lei nº 10.438/2002, a mesma que instituiu o PROINFA (Programa de Incentivos às Fontes Alternativas de Energia Elétrica) e de uns tempos para cá passou a ser vista com restrições porque vem aumentando consideravelmente todos os anos. O alerta geral foi dado neste ano, quando a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) definiu essa conta no valor de R$ 32 bilhões, sendo que R$ 30,2 bilhões serão pagos diretamente pelo consumidor. Um aumento de 34,2% quando comparamos com o orçamento de 2021, quando o encargo foi de R$ 23,9 bilhões e o consumidor arcando com R$ 19,6 bilhões. Em 2020, a CDE foi orçada em R$ 21,9 bilhões Esse valor gera um impacto médio nas tarifas de 3,39%, sendo que para os consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste representa 4,65% e para os consumidores das regiões Norte e Nordeste é de 2,41%.

Em 2018, o Relatório de Políticas e Programas de Governo divulgado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) já criticava a governança da CDE, sinalizando que não havia definição de qual problema ou qual demanda social que cada subsídio pretendia resolver ou reduzir. O TCU dizia naquela oportunidade que os subsídios eram incompatíveis com o regime jurídico tarifário do setor, pois não havia um sistema de avaliação da eficácia desses subsídios e a fiscalização da ANEEL sobre a concessão dos subsídios seria insuficiente. Nesse Relatório do TCU existem duas recomendações: a) estruturar um modelo de governança que permita o acompanhamento de todas as políticas que são subsidiadas pela CDE; b) Avaliar os impactos advindos dessas alterações na CDE, tanto sob a ótica da origem dos recursos quanto da aplicação dos montantes arrecadados.

Em dezembro de 2020, numa análise feita pelo Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas do Ministério da Economia (CMAP), foi avaliado que existia um risco elevado de falta de transparência, de previsibilidade de despesas e de estudos de impacto sobre os descontos concedidos, ainda porque não haviam metas a serem atingidas e, consequentemente, resultados a serem alcançados. O CMAP avaliou que não havia delineamento do problema social ou econômico para os descontos nas tarifas aplicadas ao setor rural e recomendou que os subsídios para irrigantes abastecidos em alta tensão fossem sendo extintos gradualmente, haja vista que 92,6% da população rural já estavam eletrificadas. O CMAP observou que os preços das fontes incentivadas (eólica e solar) já estavam no mesmo patamar das térmicas a gás ou das hidrelétricas e assim não seriam necessários subsídios para as próximas outorgas. Vários agentes do mercado também entendem que os subsídios para eólicas, solar, PCHs e térmicas à biomassa foram criados na época em que essas fontes não eram economicamente viáveis, mas que hoje não têm mais sentido, haja vista a relevância que apresentam nos leilões e no mercado de energia.

Na CDE de 2022 podemos observar que, para a CCC (Conta de Consumo de Combustíveis), que é a rubrica para subsidiar os custos anuais com geração térmica em sistemas isolados, estão destinados R$ 11,96 bilhões. Certamente que a explicação é o aumento no preço do diesel e do gás natural, que são os combustíveis que abastecem as usinas térmicas na Amazônia. A retirada desse subsídio é pouco animadora, haja vista que a interligação de Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN) ainda segue sem definição, com o impedimento da passagem da linha de transmissão por terras indígenas.

Os subsídios para o Mercado Livre e para a GD (geração distribuída) são de 11,05 bilhões, através dos descontos na TUST (Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão) e da TUSD (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição), respectivamente de R$ 1,75 bilhões e de R$ 9,3 bilhões. Esse subsídio na TUSD para a geração distribuída (basicamente para os painéis solares fotovoltaicos), para quem estiver ligado até 5 de janeiro de 2023, foi prorrogado para 2045 e, somente a partir de 2025, começará uma sistemática redução da “corrida do ouro” até 2029, quando passará o uso do fio da distribuidora também a ser pago integralmente por quem vier a se conectar ao sistema.

O subsídio para a tarifa social passou de R$ 3,6 bilhões no ano passado para R$ 5,4 bilhões, já que houve uma inclusão sistemática dos habilitados no Cadastro Único do Governo Federal ou aqueles contemplados com o Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social.

O “guarda-chuva” da CDE também abriga outros subsídios, como é o caso do carvão mineral, do PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia) e do Programa de Universalização de Energia e de Eletrificação Rural.

Neste ano eleitoral, o alerta para o custo alto das tarifas de energia elétrica, juntamente com os combustíveis e o gás de cozinha, finalmente chegou no Congresso Nacional, pois é de lá que são aprovadas as leis que determinam como a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) deve agir para calcular quanto o consumidor vai pagar pelo seu uso. Além dos subsídios, incidem na conta de luz o PIS/COFINS pelo lado federal, o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) pelo lado estadual e ainda tem a COSIP (Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública) na esfera municipal.

O STF (Supremo Tribunal Federal) já havia decidido pela inconstitucionalidade da incidência do ICMS sobre o PIS/COFINS, pois é um imposto cobrado sobre impostos. Retrocedendo cinco anos foi calculado que os consumidores pagaram R$ 60 bilhões a mais, sendo que R$ 12 bilhões já foram utilizados pela ANEEL para a redução nas tarifas, faltando ainda R$ 48 bilhões que devem servir para a mesma finalidade.

O STF também considerou que combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo são bens e serviços essenciais e indispensáveis, cuja incidência da alíquota do ICMS não pode ser superior a 17%. Não podendo ser tratados como supérfluos, o Congresso Nacional votou e o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei Complementar nº 194. Assim, foram alteradas, a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional) e a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir). Foram também alteradas as Leis Complementares nº 192, de 11 de março de 2022 e a de nº 159, de 19 de maio de 2017.

Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional o PL 414/2021, considerado o da modernização do setor, e a maioria dos agentes querem pressa na sua aprovação porque define um cronograma de abertura do mercado. Todos os consumidores de alta tensão estariam livres em 2026 e os de baixa tensão em 2030. Entretanto, existem várias questões que devem ser exaustivamente discutidas, dentre elas os subsídios, para que a modernização não venha beneficiar uma minoria causando prejuízo à maioria dos consumidores, especialmente aqueles do mercado regulado, ou seja, cativo das distribuidoras. Os subsídios ainda necessários, devem ser concedidos como políticas públicas e, consequentemente, custeados por recursos da União, via impostos, e não pelo consumidor de energia elétrica, via tarifas.

CHOQUE DE SUBSÍDIOS
por Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e Serviços

Geoberto Espírito Santo

SinergiaGeoberto Espírito Santo é Engenheiro Civil, formado em 1971 pela Universidade Federal de Alagoas. Atualmente é Consultor do SINDENERGIA – Sindicato das Indústrias de Energia do Estado de Alagoas e Personal Energy da GES Consultoria, Engenharia e Serviços – GES Consult ATIVIDADES QUE EXERCEU: - Engenheiro da Companhia Energética de Alagoas (CEAL), por 28 anos - Diretor de Operação da Companhia de Eletricidade de Alagoas - CEAL - Secretário de Administração da Prefeitura Municipal de Maceió - Assessor de Coordenação e Planejamento da Empresa de Recursos Naturais do Estado de Alagoas - EDRN - Chefe de Gabinete da Diretoria de Desenvolvimento Energético da CEAL - Assessor da Subcomissão de Minas e Energia do Senado Federal - Diretor de Distribuição e Comercialização da Companhia Energética de Alagoas - CEAL - Consultor em eficiência energética do PNUD / ELETROBRÁS - Secretário Executivo do Núcleo de Eficiência Energética na Indústria (NEEI / FIEA) - Secretário Executivo do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas - CEPE - Secretário de Estado Adjunto de Energia e Recursos Minerais de Alagoas - Vice-Presidente de Planejamento Energético do Fórum Nacional dos Secretários de Estado para Assuntos de Energia - FNSE - Representante da Região Nordeste no Conselho Consultivo da Empresa de Pesquisa Energética – EPE - Diretor Presidente da Gás de Alagoas S.A. – ALGÁS - Vice-Presidente do Conselho Estadual de Política Energética de Alagoas – CEPE - Presidente do Conselho Fiscal da ABEGÁS – Associação Brasileira das Empresas das Empresas Distribuidoras de Gás Natural – ABEGÁS - Professor nas disciplinas de Eletricidade e Eletrotécnica, no Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Alagoas – UFAL - Membro do Conselho Estadual de Política Energética – CEPE LIVROS E TRABALHOS PUBLICADOS: - Protestos e Propostas (EDUFAL) - Energia: Um Mergulho na Crise (IGASA) - Política e Modelagem do Setor Elétrico (Imprensa Oficial GRACILIANO RAMOS) - Espírito Cidadão (EDUFAL) - Vários trabalhos sobre energia publicados nos anais de Seminários, Congressos Nacionais e Revista Internacional

Um Comentário em “CHOQUE DE SUBSÍDIOS

PIETRO ERBER
18 de julho de 2022 em 10:48

Prezado Geoberto
Parabéns pelo seu artigo sobre a CDE, informativo, oportuno e objetivo.
Subsídios permanentes, sem metas e critérios de avaliação de eficácia, a não ser o sucesso dos beneficiados, são insustentáveis por falta de justificativa e excesso de custo para a maioria dos consumidores.
Abraço
Pietro Erber

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